Tenho chorado pela vida afora com perdas de gente importante de meu país, não nego. Mas, por pessoas de outro país não me lembro de ter derramado lágrimas, eu que choro à-toa, até no cinema ou diante da televisão.
Chorei ante-ontem e ontem a morte de Néstor Kichner aos sessenta anos, de um infarto fulminante. Abalou-se meu alicerce da alma latino-americana, defensora do pensamento socialista, aquela idéia utópica que não se executa bem no mundo, infelizmente.
Levei um susto e comecei a ver e ler tudo o que podia sobre este ex-presidente de um país que tanto me agrada visitar, pelo menos, em sua capital, a formosa Buenos Aires, me entusiasma com sua música romântico-dramática, com seus jogadores de futebol ( Maradona Messer, Conca, este último, no Fluminense...), com seus atores e cinema, sobretudo com seus escritores do porte de Borges e Cortázar.
Para minha alegria, não percebi nos jornais brasileiros nenhum tipo de crítica a Kichner, a não ser à noite, quando o canal de tevê Globo News, ouvindo gente em quem não confio plenamente, falou de sua tendência peronista, de seu populismo etc. etc. Um único comentarista.
Populismo é uma palavra muito usada mesmo hoje, para todos os presidentes que fazem algo pelo povão de sua terra, que não objetivam apenas agradar os ricos e poderosos. O que não significa que os governantes tenham que se vestir de índios ou atacar todos os capitalistas que abundam por aí, como Quixote.
Não creio que o termo se aplique ao ex-presidente da Argentina, Néstor Kichner. Pelo que recordava e voltei a saber pelos jornais de minha própria terra, a trajetória do homem foi impecável. E quando assumiu o governo, depois de um bando de corruptos “entreguistas”
( aqui emprego um termo muito usado pela esquerda brasileira contra os que faziam a apologia dos Estados Unidos e não se envergonhavam de dele depender tanto).
Entre suas muitas façanhas elogiáveis, Kichner salvou a Argentina de uma de suas maiores crises econômicas, depois da famigerada ditadura e dos presidentes que o antecederam. Outra boa atitude foi a de revogar a anistia política aos gorilas da ditadura, para espanto de muitos, para que nenhum argentino se esqueça dos horrores, haja vista as abuelas da Plaza de Mayo. Além de ter renegociado uma dívida gigantesca com o tal do FMI.
Foi tão bom governante que, apesar de fazer parte – talvez pour cause – dum partido que contém em si o germe do peronismo, os Justicialistas, elegeu sua companheira política e mulher, Cristina Kichner, apesar de ser do sexo ainda hoje discriminado.
Seu funeral foi lindo como os funerais mais concorridos a que tenho assistido pela televisão e pela internet. Os chamado mozos da Casa Rosada, que de moços não têm nada, choravam copiosamente, assim como choravam e cantavam velhos, adultos e moços – vide vídeos no jornal La Nación, que não tem lá muitos motivos para festejar Cristina.
Emocionante o abraço da filha na mãe-presidenta, sob o olhar embaçado do filho. Mais emocionante para mim o de Lula em Cristina, simbolizando a união de dois povos importantes da América Latina.
E o canto de um cantor de voz poderosa ecoando pelo cemitério foi demais para a mulher-presidenta que, em ritus de boca, a custo conteve as lágrimas, cantando o hino também.
Agora, em meio a comoção geral, os argentinos afirmam seu apoio incondicional à Cristina, esquecidos do que diziam do time Néstor-Cristina. Deus queira que as palavras o vento não leve.
Maria Lindgren
Parabés Maria Lindgren pela rica e emocionada crônica! Uma Bela homenagem!
ResponderExcluirGrata por nos trazer um pouco mais de Néstor Kichner...me atiçou a saber mais...
Gosto muito dos teus escritos...bom que estar por aqui...assim não te perco
beijos com carinho agradecido da Eliana